19 de setembro de 2017

Como tomar suas próprias decisões com análise-raiz

É extremamente desafiador simplesmente não aceitar tudo que nos é dito e mostrado, pois é infinitamente mais cômodo crer no que vemos e no que é aceito como verdade ou normal. Porém, apesar de ser cômodo, perde-se muito conhecimento (especialmente auto-conhecimento) ao aceitar cegamente aquilo que é exposto à você. Nesta postagem irei explicar como tento assimilar o mundo ao meu redor e seus componentes.

Tudo que acontece na minha vida ou passa pela minha cabeça precisa ser submetido à uma análise-raiz. Inventei este termo agora, pois acho que nunca me deparei com este conceito na literatura (se alguém souber um nome oficial para isto, deixe no comentário, por favor). O que chamo de análise-raiz é uma avaliação que me leva a raiz da situação, para que eu consiga entender sua origem e o que, de fato, está acontecendo. No mundo atual, devido ao excesso de informações a que somos expostos constantemente, acabamos não dedicando o tempo adequado para analisar e entender o que acontece ao nosso redor e o que passa pela nossa cabeça. Muitas vezes vemos ou pensamos algo e aquilo é aceito como verdade imediatamente.

A nossa realidade nos incentiva a enxergar apenas os galhos da árvore que é nossa vida. Nossa árvore da vida começa bem pequena, como uma mudinha. Quando somos bebês, nossos desejos são muito simples e nossas vontades são poucas. Quando somos crianças, apesar da árvore estar maior, ainda existem poucos galhos  e o foco é no tronco, sendo ainda possível enxergar a raiz com facilidade. Quando nos tornamos adultos, nossa árvore da vida cresceu por muitos anos e está bem alta e robusta. Na fase adulta, a árvore está repleta de galhos, folhas, flores e frutos. É impossível enxergar a raiz facilmente devido a quantidade de coisas que acontecem constantemente e precisam da nossa urgente atenção. Passamos boa parte do tempo da fase adulta nos preocupando com as formiguinhas insignificantes que se alimentam das nossas folhas, porém sem causar dano na árvore como o todo, e não percebemos que uma parasita destruidora se acoplou à base do nosso tronco. Ou então não sentimos aqueles cupins lentamente comendo nossa raiz, gradualmente nos privando da nossa fonte de vida. Na velhice, se chegarmos lá com nossa árvore intacta, os frutos param de nascer, as flores e folhas são mais escassas, e os galhos apodrecem e caem. Na velhice se torna mais fácil enxergar novamente a raiz, pois as coisas voltam a serem simples e menos volumosas. É nesta fase que costumamos perceber os danos irreparáveis que foram causados à árvore, surgindo diversos arrependimentos por coisas que poderiam ter sido feitas diferentes. Não conseguimos entender como desviamos tanto do nosso caminho e como pudemos negligenciar nosso tronco e nossa raiz por tanto tempo.

Estágios da vida: (1) infância; (2) adolescência; (3) adulta; (4) velhice.

Minha proposta de vida é diferente disto que detalhei acima. Não sou perfeito e me pego falhando mais vezes que gostaria, porém me recuso a abandonar meu tronco e minha raiz por causa de galhos e folhas. Antes de deixar qualquer galho novo nascer ou qualquer fruto ou flor brotar, eu paro e faço uma análise-raiz para ver se essa ação faz sentido e se ela representará o melhor interesse da minha árvore como um todo. Eu vou a origem da ação e vejo se ela é compatível com o que quero para minha árvore. Isto é fundamental, pois são infinitas as forças que influenciam direta e indiretamente o desenvolvimento da nossa árvore.

Poderia escrever mais alguns parágrafos sobre esta analogia da árvore, mas vou parar aqui, pois este blog não é sobre botânica. O ponto é que não costumamos prestar atenção nos fatores que influenciam nossa vida e não paramos para analisar cada um em detalhe, desde sua origem. A prática de observar coisas normalmente aceitas como verdade e comum para ver se elas realmente fazem sentido é o que chamo de análise-raiz.

Vamos a um exemplo prático? Bebês chupam chupeta. Isso é um fato, certo? Chupeta é vendida em todos os lugarem que vendem acessórios para bebês. Praticamente todos os bebês que você vê estão chupando chupeta ou possuem uma chupeta por perto. Portanto, quando você tiver um filho, você certamente comprará uma chupeta para ele, afinal, é normal. Quando minha esposa engravidou, eu tinha este conceito pré-definido em minha mente, pois era o que sempre via. Mas, como tenho como hábito fazer uma análise-raiz das coisas, comecei a refletir sobre a chupeta. Chupeta é extremamente comum e quase todas as crianças usam ou usaram em algum momento. Mas por que? No momento em que você para e pergunta "por que", tudo muda. Por que bebês e crianças usam chupeta? Porque servem como pacificadores e os acalmam, certo? Mas calma, bebês possuem necessidades extremamente básicas, como alimentação (leite ou comida), higiene (troca de fralda), roupas (para manter sua temperatura ideal), descanso (dormir) e afeto e amor (tempo, carinho e atenção de alguém). Se o bebê não está calmo é porque algo desta lista está faltando. Não me parece que a chupeta seria a solução adequada para nenhum desses fatores. Por que meu bebê precisa de uma chupeta se eu consigo e tenho como obrigação atender suas necessidades básicas? Se ele chorar, passo pela lista de coisas e vejo o que está faltando. É fome? Sono? Frio? Estou no celular ou TV ao invés de brincando com ele? Ao garantir que suas necessidades básicas estão sendo atendidas, o bebê automaticamente acalmará e ficará bem. Então, por que a chupeta?

Hoje meu filho está para entrar em seu segundo ano de vida e nunca usou chupeta. Nem chupou dedo, nem nada do tipo. Dei sorte? Talvez. Mas não coloquei uma chupeta na boca dele a primeira vez que ele chorou quando saiu da maternidade e em nenhuma outra vez que ele precisou de algo que eu ou minha esposa tínhamos como obrigação prover. Nunca precisei gastar dinheiro com chupeta e não tenho que lidar com o vício da chupeta. Também não preciso me preocupar com má formação dentária, o que diminui muito a chance dele usar aparelho mais pra frente. Sem contar que não vou precisar também fazer todo aquele trabalho emocional para tirar a chupeta dele no futuro. Tudo isso pela simples decisão de questionar a necessidade da chupeta, algo comum e usado por quase todos. Chupeta não foi necessária para o meu filho e diria que não é necessária para a maioria das crianças. Muito pais usam a chupeta porque é normal e é vendida em todos os lugares que vendem acessórios para bebês. Uma análise-raiz do tema chupeta me fez entender isso e eliminar totalmente a dependência dela da vida do meu filho. Economizamos danos físicos (alteração da musculatura e estrutura óssea da face), psicológicos (apego emocional à chupeta) e financeiro (cada chupeta pode custar de R$20 a R$80).


A chupeta é mesmo necessária para bebêfanhotos?
A análise-raiz, se for praticada constantemente, irá garantir que você não seja apenas uma ovelha em um rebanho, seguindo um pastor qualquer. Ela permite que você pense por conta própria e tome a melhor decisão para você. Não pelo fabricante de chupetas ou pelas infinitas indústrias que governam nosso mundo, mas sim por você. Isto exige constante atenção e dedicação, pois é mais fácil aceitar o padrão do que questiona-lo em busca de uma solução melhor. Sempre que você ver algo, pare e se pergunte, "por que?". Faça isso com a coisa mais básica até a mais complexa, seja nos acontecimentos que você vê ao seu redor ou até mesmo com os pensamentos que habitam sua mente.

Quando você pensar que deseja comprar algo, pare e se pergunte, "por que?". As pessoas frugais simplesmente tentam bloquear esse tipo de pensamento, descartando a vontade como um supérfluo da vida. Mas isso não te ajuda a crescer. A frugalidade no sentido de evitar exageros e desperdícios é uma prática incrível, com potencial de mudar o rumo da humanidade, porém segui-la cegamente não apresenta oportunidade de crescimento pessoal. Ao se perguntar o motivo do desejo, através de uma análise-raiz, você certamente irá entender algo sobre você mesmo e o mundo ao seu redor, saindo da situação como uma pessoa mais sábia e completa.

Por exemplo, vamos imaginar a situação do lançamento do iPhone X, anunciado na semana passada pela Apple. Aparelho incrível, com tecnologia de ponta. Será o smartphone mais avançado do mundo quando sair. Será o aparelho que líderes de nações, atores de Hollywood e CEOs usarão em seu dia a dia. Por U$1.000 todos nós poderemos carregar no bolso o smartphone mais incrível do mundo. Quando vi o anúncio, pensei, "Quero um!". Ai fiz uma análise-raiz do meu desejo:

-Por que quero um iPhone X? Porque ele é muito legal, claro. 
-E por que ele é muito legal? Porque ele tem uma tela linda, carrega sem fio, é mais rápido e é incrível! 
-A tela linda vai me permitir enxergar algo que não posso enxergar com meu celular atual? Não. 
-Ele carregar sem fio vai mudar algo na minha vida, considerando que o aparelho precisa ficar encostado em uma base ligada na tomada? Não. 
-Ser mais rápido é legal, mas economizar 0,001s ao abrir um app vai melhorar minha vida? Não. 
-Resta só o fato dele ser incrível. Por que quero um celular incrível? Porque o meu ficará ultrapassado e as outras pessoas terão um celular melhor que o meu.
-E qual o problema das pessoas terem um celular melhor que o meu? O que isso muda na minha vida? Nada.
-Eu queria o iPhone X antes dele ser anunciado ou estava contente com meu aparelho? Estava contente com meu aparelho e só quis após ver o anuncio.
-Então o que me fez querer o iPhone X foi uma jogada de marketing da Apple e não é uma vontade própria minha? Sim, é o que parece.
-Tenho algum interesse em realizar as vontades da Apple e deixa-la controlar o que quero e desejo? Não.
-Eu ainda quero um iPhone X? Não.

Pronto! Após uma análise-raiz, cheguei a conclusão que não queria o iPhone X. Alias, esta análise me permitiu reconhecer que o novo iPhone não agrega nenhuma tecnologia inovadora e não apresenta nada que possa melhorar minha vida. Se, por exemplo, ele carregasse sem fio ao entrar em casa, sem precisar encostar numa base, talvez eu comprasse, pois teria um potencial de melhorar minha vida e diminuir o risco de cabos soltos pela casa (mas teria que fazer uma nova análise-raiz para ver se realmente faria sentido comprar nessas condições). Alimentar um interesse pelo novo aparelho da Apple, como vimos, era um desejo da Apple, não meu. Se eu fosse simplesmente frugal, descartaria o desejo como sendo algo desnecessário, mas não iria entender por que o iPhone X é desnecessário. Ao realizar uma análise-raiz, descobri que ele é desnecessário por não apresentar nenhuma inovação significante e por não apresentar nada novo que eu gostaria de ter num smartphone. Descobri algo sobre o mundo (iPhone X é medíocre) e algo sobre mim mesmo (o que gostaria de ter num smartphone).

Este conceito de análise-raiz pode ser usado em qualquer aspecto da vida. Trabalho, política, futebol, casamento, hábitos de consumo, hobbies, viagens, investimentos, etc. Falando um pouco sobre investimentos agora. Todos os ativos em sua carteira estão lá porque você realmente quer ou talvez estão lá por serem o padrão ou por causa da vontade de um terceiro? Você está querendo comprar Bitcoins agora porque todos estão falando sobre o assunto ou porque você realmente acredita na tecnologia? Você está querendo comprar ações da empresa XXXX11 porque você realmente acredita nela ou porque viu uma recomendação em algum lugar? Você quer investir em ações americanas porque você acredita nas empresas americanas ou porque alguns colegas fizeram isso e porque é bonito ter ações americanas? Sugiro você parar e se perguntar por que tem cada ativo em sua carteira. Faça uma análise-raiz para ver se eles condizem com seus pensamentos e se realmente vieram de ideias próprias. 

Nunca deixe de enxergar as raízes da sua árvore da vida. Existem infinitas forças no mundo atuando para que você perca sua raiz de vista, inundando sua árvore com galhos, folhas e frutos desnecessários, que não estão alinhados com seus objetivos de vida. Estas forças estão te distraindo enquanto, como uma parasita ou um cupim, gradualmente sugam sua vida de maneira despercebida. Decida por você mesmo o que você quer e precisa para ter uma vida feliz e saudável. Na próxima postagem vou listar os piores gastos que uma pessoa pode fazer ao longo de sua vida. É incrível quanta felicidade você pode gerar e quanto dinheiro economizar ao usar o conceito de análise-raiz.

9 comentários:

  1. Cara seus posts são otimos!

    Não pare nunca de escrever, abraços!!

    Marco

    ResponderExcluir
  2. Olá, amigo.
    Como dito acima, os seus textos são bons, precisamos de mais blogs assim no Brasil.
    Sobre o artigo em si, o que você chama de "Análise-Raiz" nada mais é do que um processo de auto-conhecimento sobre si mesmo, o que proporciona um conhecimento melhor sobre a realidade que o cerca.
    Creio que é uma maneira boa, eficaz e produtiva de encarar os desafios da nossa vida moderna.
    Um abraço

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Soul!
      Obrigado pela mensagem!
      Concordo com seu comentário sobre o processo. Auto conhecimento é fundamental para estarmos preparados para lidar com o mundo ao nosso redor, especialmente com todas as forças que atuam para nos influenciar.
      Obrigado pela visita e um abração!

      Excluir
  3. Olá,
    Parabéns pelo blog, continue sempre nos presenteando com suas reflexoes e excelentes textos! Vc definitivamente tem dois importantes dons: o da didatica e do bom senso. Este último, tao escasso atualmente, o levou a deduzir a técnica conhecida como "análise da causa raiz" e uma das ferramentas utilizadas nesses processos, o "5 porques".
    Grande abraço!
    Andre

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Andre! Muito obrigado pela mensagem, pois este tipo de retorno é o que motiva a continuar escrevendo. Tenho muito mais prazer em escrever postagens como esta, com potencial de explicar e ajudar pessoas a mudarem a visão do mundo, do que postagens de patrimônio financeiro, por exemplo.
      Trabalhei bastante em TI, portanto análise de causa raiz sempre foi algo que esteve profissionalmente presente. Mas ela em si é limitada e técnica, pois geralmente é aplicada quando já existe um problema conhecido. O que propus no texto é uma abordagem mais filosófica, ao fazer uma análise raiz de tudo em nossa vida, pelo menos uma vez. Muitas coisas que são consideradas normais ou padrão não refletem o melhor interesse de cada pessoa. Todos tem ou querem um carro, por exemplo, mas será que isto é realmente bom pra você? Todos os bebês chupam chupeta, como citei na postagem, mas será que chupeta realmente é bom para seu bebê? A ideia é questionar o básico para evitar que problemas/insatisfação/infelicidade surja, através do auto-conhecimento.

      Excluir
    2. Eu procuro usar sempre a "analise de causa raiz" e os "5 porques" no meu dia a dia, ajuda muito sobretudo pra um cada impulsivo como eu. Graças a ela tb nunca dei chupeta pros meus filhos e compro roupas somente quando as atuais jã não são mais utilizáveis (um furo ou outro não me incomoda :)). E olha que sou Diretor de uma empresa, o que traz uma pressão grande neste sentido.

      Grande abraço!

      Excluir